A memória anda me
traindo muito. Não sei se estava vendo um filme, se a Beth navegava na internet
quando o telefone tocou. Do outro lado nossa filha Laura em prantos: Julie
morreu!
Nós estupefatos, sem
entender bem o que acontecera. Miss Julie London aproveitou um momento de
descuido e escapuliu do apê. Correria e choro. Laurinha se descabelava,
inconformada. Aos poucos foi se acalmando até conseguir nos explicar o que
realmente ocorrera. Quando sentiu falta da gatinha desandou a procurá-la por
todos os cantos e nada de encontrá-la. Foi à rua no exato momento em que um
caminhão de coleta de lixo estacionava. Ela perguntou ao gari se não tinha
visto uma gata e ele confirmou que acabara de recolher uma. Pra infelicidade de
minha filha tinha a mesma cor de miss Julie. O berreiro aumentou.
Tinha se apegado
tanto a miss Julie London que não conseguia aquilatar a ideia de tê-la perdido.
Pôs a mente a imaginar como seria o funeral. Será que em Curitiba, o crematório
aceitaria cremar a gatinha, ou será que existia um cemitério para pequenos
animais.
Aqui, distantes,
impossibilitados de viajar àquela hora, pois após verificarmos na internet os
próximos voos só tinham lugares disponíveis dois dias depois, sofríamos a mesma
dor de nossa filha.
Aquela que julgava
ser miss Julie jazia numa sacola. O que restara foi apenas dor e saudade.
O acúmulo de
trabalhos pra entregar na faculdade, a solidão permanente, tudo era somado
naquele momento aumentando a dor de nossa filha.
Já era noite feita
quando Stéphanie chegou e encontrou a irmã aos prantos. Suas lágrimas se
somaram. A tristeza tomou conta do apê. E nós no longínquo Mato Grosso sem nada
poder fazer.
De repente Sté
escuta um barulho. Era um miado. Logo outro, depois outro e mais outro. Abriram
a porta do apê e saíram voando procurando localizar a origem do som. Eis que o
impossível acontece. Miss Julie London sai enlameada do lixo, fedendo a restos
de comida, mas viva. O choro aumentou, mas desta vez acobertado de alegria. O
banho foi de gato. No outro dia a doutora Priscila cuidaria vagarosamente de
higienizá-la pacientemente, soubemos depois.
Novamente o telefone
toca. Ligação a cobrar. Com o coração quase saindo pela boca atendi. Era Laura
comunicando-nos que a fujona saíra pra dar uma volta. O animal morto tinha suas
características, nada além disso.
Regozijamos. Na
verdade a presença de miss Julie na vida de Laura dispensava a intervenção de
um psicólogo ou psiquiatra. Nos momentos difíceis, os desencontros com colegas
que, pelo fato de serem ricos a espezinhavam, aprofundaram a crise de
ansiedade. Julie foi sua tábua de salvação.
Agora que ela está
sã e salva em casa, rendo graças ao bom Deus por tê-la trazido de volta pro
convívio de minhas filhas.
Espero que a arteira
da miss Julie London jamais repita a proeza de fugir de casa. A dor da possível
perda acabou afetando, por instantes, a família inteira.
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