sábado, 21 de dezembro de 2013

O ABALO SÍSMICO


A memória anda me traindo muito. Não sei se estava vendo um filme, se a Beth navegava na internet quando o telefone tocou. Do outro lado nossa filha Laura em prantos: Julie morreu!

Nós estupefatos, sem entender bem o que acontecera. Miss Julie London aproveitou um momento de descuido e escapuliu do apê. Correria e choro. Laurinha se descabelava, inconformada. Aos poucos foi se acalmando até conseguir nos explicar o que realmente ocorrera. Quando sentiu falta da gatinha desandou a procurá-la por todos os cantos e nada de encontrá-la. Foi à rua no exato momento em que um caminhão de coleta de lixo estacionava. Ela perguntou ao gari se não tinha visto uma gata e ele confirmou que acabara de recolher uma. Pra infelicidade de minha filha tinha a mesma cor de miss Julie. O berreiro aumentou.

Tinha se apegado tanto a miss Julie London que não conseguia aquilatar a ideia de tê-la perdido. Pôs a mente a imaginar como seria o funeral. Será que em Curitiba, o crematório aceitaria cremar a gatinha, ou será que existia um cemitério para pequenos animais.

Aqui, distantes, impossibilitados de viajar àquela hora, pois após verificarmos na internet os próximos voos só tinham lugares disponíveis dois dias depois, sofríamos a mesma dor de nossa filha.

Aquela que julgava ser miss Julie jazia numa sacola. O que restara foi apenas dor e saudade.

O acúmulo de trabalhos pra entregar na faculdade, a solidão permanente, tudo era somado naquele momento aumentando a dor de nossa filha.

Já era noite feita quando Stéphanie chegou e encontrou a irmã aos prantos. Suas lágrimas se somaram. A tristeza tomou conta do apê. E nós no longínquo Mato Grosso sem nada poder fazer.

De repente Sté escuta um barulho. Era um miado. Logo outro, depois outro e mais outro. Abriram a porta do apê e saíram voando procurando localizar a origem do som. Eis que o impossível acontece. Miss Julie London sai enlameada do lixo, fedendo a restos de comida, mas viva. O choro aumentou, mas desta vez acobertado de alegria. O banho foi de gato. No outro dia a doutora Priscila cuidaria vagarosamente de higienizá-la pacientemente, soubemos depois.

Novamente o telefone toca. Ligação a cobrar. Com o coração quase saindo pela boca atendi. Era Laura comunicando-nos que a fujona saíra pra dar uma volta. O animal morto tinha suas características, nada além disso.

Regozijamos. Na verdade a presença de miss Julie na vida de Laura dispensava a intervenção de um psicólogo ou psiquiatra. Nos momentos difíceis, os desencontros com colegas que, pelo fato de serem ricos a espezinhavam, aprofundaram a crise de ansiedade. Julie foi sua tábua de salvação.

Agora que ela está sã e salva em casa, rendo graças ao bom Deus por tê-la trazido de volta pro convívio de minhas filhas.

Espero que a arteira da miss Julie London jamais repita a proeza de fugir de casa. A dor da possível perda acabou afetando, por instantes, a família inteira.

 

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